segunda-feira, 15 de abril de 2013

Falta de dente pode custar uma vaga em concurso publico





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Os dentes, ou melhor, a falta deles, podem, sim, eliminar candidatos de concursos públicos. Você é bem gordinho? Mede menos de 1,50m ou mais de 2m? Tem tatuagem visível ao olho comum? Se as respostas são positivas, então, prepare-se: você pode vencer a difícil etapa da aprovação, mas ter sua contratação negada. Essas são apenas algumas das exigências questionáveis — e, em alguns casos, esdrúxulas — que constam de diferentes editais, de Norte a Sul do país, muitas vezes preparados às pressas por necessidade de preenchimento de quadros. A polêmica é garantida, e a maioria dos casos acaba mesmo é na Justiça.
Exame ginecológico foi derrubado
Levantamento de 2010, feito pelo Ministério Público (MP) do Estado do Rio, mostra que os concursos lideram as reclamações à sua Ouvidoria — 9,12% de 100 mil registros em cinco anos (ou seja, 9.106). Nos últimos anos, também cresceram as denúncias à Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos Públicos (Anpac), que chegam a 50 e-mails/dia. Incluem-se aí queixas contra as bizarrices de editais.
O caso mais recente, e que teve grande repercussão, foi a seleção para a Polícia Civil da Bahia. O edital dizia que as candidatas aos postos de delegada, escrivã e investigadora teriam que passar por “avaliação ginecológica detalhada, contendo os exames de colposcopia, citologia e microflora”, o tal do papanicolau. Os exames seriam dispensados para aquelas “com hímen íntegro”, que, no entanto, deveriam comprovar a virgindade via atestado médico, com assinatura, carimbo e CRM do profissional. O governador Jacques Wagner acabou intervindo e determinando a suspensão dos itens que pudessem constranger ou discriminar as mulheres.
Para Alexandre Lopes, advogado e professor especialista em direito público, exigências esdrúxulas como a da Bahia são abusivas: violam o inciso III do artigo 1º da Constituição, que consagra o princípio da dignidade, bem como seu artigo 5º, que dispõe sobre o princípio da igualdade e o direito à intimidade, vida privada, honra e imagem:
— Exigir que as mulheres se submetam a tamanho constrangimento é, no mínimo, discriminatório, uma vez que tal exigência não tem qualquer relação com as atribuições do cargo. Além disso, torna mais oneroso o concurso para as candidatas do gênero feminino.
Sérgio Camargo, também advogado e professor de direito público, ressalta que as limitações contidas nos editais são legais, quando pertinentes ao exercício da função. Caso do peso do candidato em editais para algumas tarefas em órgãos de segurança pública e força militar. Mas só se pertinentes:
— Em outras funções, como no concurso de 2011 para professor da rede estadual de São Paulo, em que candidatos foram eliminados por estarem obesos, não vejo razão, já que a robustez física nada tem a ver com a docência. No caso, a constitucionalidade é duvidosa.
Maria Thereza Sombra, da Anpac, vai além. Tais exigências, diz, têm prejudicado a imagem dos concursos, já que a lei não prevê limites de peso, altura, entre outros, na criação das carreiras.
A procuradora do Trabalho Lisyane Chaves Motta reforça que a inclusão de itens discriminatórios atinge direitos fundamentais e que existem medidas judiciais que podem ser adotadas tanto pelos candidatos quanto pelo Ministério Público, de forma prévia, através do questionamento do edital ou após a realização das provas:
— O Ministério Público pode buscar judicialmente ou extrajudicialmente que sejam retirados itens discriminatórios do edital. Pode ainda pleitear judicialmente a nulidade do concurso.
Para evitar surpresas na hora H, os candidatos devem fazer uma leitura minuciosa do edital, analisando item por item, e não só aqueles referentes às disciplinas exigidas. Até para saber o que precisará enfrentar.
— O candidato deve ficar atento a todos os detalhes, se inteirar sobre critérios de ingresso: o que pode ter ou não — sugere o advogado Alexandre Lopes.
Apesar de saber dos pormenores do edital do concurso de 2008 da Polícia Militar do Rio, que proibia tatuagens, o carioca Rafael Rosales da Matta, de 27 anos, decidiu arriscar. Como já era esperado, passou pelas duas primeiras fases da seleção, mas acabou reprovado no exame médico:
— Mesmo tendo duas tatuagens, homenagem que fiz a meu pai após ele sofrer dois enfartes, fiz o concurso. Há policiais tatuados, e os meus desenhos só são vistos quando estou de bermuda e camiseta. Por isso, eles só seriam percebidos durante os exercícios físicos aos quais os soldados são submetidos, mas não ao usar a farda.
Depois de mais de três anos de luta na Justiça, no mês passado, saiu a sentença definitiva, dando ganho de causa a Rafael, que está licenciado. A decisão do Supremo Tribunal Federal já foi publicada e, agora, ele aguarda a notificação para ser definitivamente reintegrado à corporação.
Eliminado apenas pela probabilidade
— A luta foi grande, mas valeu. Minha vitória servirá de exemplo tanto para os colegas que perderam na Justiça, quanto para aqueles que venham a sofrer retaliação semelhante — diz da Matta.
Embora polêmica, diz o advogado Sérgio Camargo, tatuagem só pode impedir a participação de um candidato quando a aparência for determinante para o exercício funcional. Ou seja, se o desenho for no rosto, pescoço, ficando muito à vista.
O que causou a eliminação de Alex Couto do concurso para os Bombeiros do Rio, no entanto, não constava do edital. Com 21 anos, ele foi aprovado na prova escrita e no exame de aptidão física, mas parou por aí. Durante a avaliação médica, foi detectada uma escavação no nervo ótico, problema que pode levar ao glaucoma, e ele foi reprovado. Só que o jovem não apresentava nenhum sintoma ou outro indício que pudesse, um dia, ter a doença.
Inconformado com a eliminação, Alex se submeteu a exames complementares, que comprovaram estar saudável e sem nenhum problema oftalmológico. Diante da recusa da corporação em aceitar os exames e sua reincorporação ao concurso, o jovem entrou na Justiça. Ele agora aguarda os trâmites legais e torce para ganhar a causa:
— Só tinha duas opções: fazer novo concurso ou entrar na Justiça. Como, no meu caso, não há cirurgia que possa corrigir o problema, optei pela ação.
Anpac pede regulamentação do setor
Segundo a Anpac, “para moralizar os concursos e reduzir as reclamações dos candidatos”, é preciso criar norma jurídica que regulamente esses processos (estabelecendo prazos, reserva de vagas, período de validade etc.).
— A regulamentação não deve e não pode esperar mais. Tem que ser definitiva, ágil e promulgada em todas as esferas do poder público — afirma a vice-presidente da entidade, Maria Thereza Sombra, lembrando que, no âmbito federal, projeto de lei nesse sentido, o 4.689/12, está em análise na Câmara dos Deputados. — “Quero lei” devia ser o slogan de todos os concursandos.

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